Fumaça branca: Antonio Mohamed é o novo treinador do Atlético-MG. Após uma longa novela que envolveu negociações e recusa de portugueses, o Galo fechou com "El Turco", argentino de 51 anos com longa carreira no futebol mexicano.
Sem clube desde o fim de 2020, Antonio Mohamed é um dos bons treinadores do futebol mexicano na última década. Ele tem passagens marcantes pelo Tijuana, América e Monterrey, onde venceu os "Aperturas", títulos nacionais no México. O último título foi conquistado há dois anos e marcado pela promessa feita ao filho de Mohamed, morto em 2006.
Mohamed se define como um treinador camaleônico. Em diversas entrevistas, ele diz que não tem um esquema, modelo ou estrutura de jogo pré-estabelecidas, sendo tudo definido a partir das características do elenco que tem para trabalhar. Tanto que uma de suas frases mais conhecidas e ditas em muitas entrevistas é a de que o "jogador está acima do sistema".
De fato, suas equipes eram bem mutantes. No Tijuana que foi eliminado pelo próprio Galo em 2013, a base era um 4-2-3-1, com Riascos pela esquerda. No Monterrey, usou várias vezes um 5-4-1. No América, um 4-4-2 ortodoxo, com duas linhas de quatro, assim como na última passagem pelo Huracán. No Celta de Vigo, um 4-1-3-2 para deixar Iago Aspas, estrela da equipe, mais perto do gol.
Mesmo com um perfil bem adaptável, Mohamed tem algumas preferências, que podem ser vistas a partir do momento que se estuda suas equipes.
- Seus times raramente mantém a bola por muito tempo e preferem um estilo mais rápido e vertical, o chamado ataque rápido
- Quase sempre prefere times agressivos na defesa, que combatem bastante. Tanto que, no Monterrey e no Huracán, o meio-campo avançava e atuava longe da defesa
- Gosta de goleiros saindo para o jogo e zagueiros que sabem dar passes para os atacantes
- Os laterais ganham vários papéis e nem sempre ficam fixos pelo lado, podendo muitas vezes recuar até a base, a linha do goleiro.
Na construção das jogadas, flexibilidade e mobilidade
Essas características ficaram evidentes em sua última equipe, o Monterrey. Tinham, como segue o mantra de El Turco, o papel de potencializar as características dos jogadores. Pensando que há três etapas do jogo no ataque - a iniciação das jogadas, a construção e a finalização delas, uma das ideias mais marcantes de "El Turco" era a forma de iniciar o jogo lá de trás: sempre com o goleiro e com dois zagueiros, mas nunca com um volante recuado entre eles.
Observe: a iniciação é feita com um lateral mais recuado, buscando a bola. Sem a chamada "saída de três", nem mesmo com o lateral na linha dos volantes.
Já no Celta, a saída de três foi usada pela presença de Roncaglia, lateral argentino mais defensivo e passador, menos de apoio. Ele ficava junto aos zagueiros nesse momento de iniciação.
Essas estruturas variavam muito ao longo do jogo. No Celta, Beltrán podia recuar e Roncaglia ia por dentro. No Monterrey, Gónzalez recebia a bola por todas as partes. Dá para dizer que o primeiro volante é uma peça fundamental para El Turco: ele é o grande iniciador do time, que recebe, conduz e já liga ao ataque. E deve fazer isso de forma rápida, o que difere muito do time de Cuca, que tinha bastante mobilidade e cadência.
Ataques rápidos, que trabalham bem o conceito da profundidade
Nas imagens acima, é possível ver defensores, meio-campistas...e os atacantes? Se existe algo no qual Mohamed é menos flexível e "impõe" em seus times, é a ideia de atacar de forma muito direta e vertical, com muita profundidade, o tempo todo.
O que é profundidade? É o quanto um time se espalha para ficar perto do gol adversário. Quanto mais próximo, maior a profundidade. Ou seja...em suas equipes, há sempre um, dois ou até três atacantes mais enfiados, seja pra servirem de base a uma ligação direta, seja para aquele toque rápido para alguém sair na cara do gol. Rogelio Funes Mori sabe muito bem disso: cansou de fazer gols assim com Mohamed.
Veja aqui: o Celta chega numa etapa de construção do jogo e ao invés dos jogadores ao redor da bola se aproximarem de costas, eles buscam se colocar de frente pro gol. Correm no espaço. Tudo para receber a bola de frente, nas costas da defesa.
Celta trabalha a profundidade — Foto: Reprodução
É algo que se repete o tempo inteiro. Nos jogos vistos para essa análise, chegava a ser repetitivo os movimentos: bola no lado, todo mundo corre no espaço e dá profundidade. Bola pelo centro, ninguém aproxima: conduz e espera o desmarque.
Um olhar desavisado pode ver a imagem abaixo e achar que falta uma opção de passe ao jogador com a bola. Essa opção, do camisa 10, até vem. Mas o resto do time já se coloca em posição para correr e atacar os espaços que sobram.
Monterrey ataca o tempo todo em profundidade — Foto: Reprodução
Defesa: variações e gosto pelo 4-4-2 com duas linhas de quatro
Reconhecidamente um treinador camaleônico, os times de El Turco defendem de muitas maneiras. Podem avançar mais e tentar roubar a bola próximo do gol, como o Monterrey e o Celta faziam. Podem recuar um pouco mais e esperar, como o América e o Huracán.
Monterrey marcava mais à frente, mas no seu próprio campo se fechava num 4-4-2 — Foto: Reprodução
Podem defender com linha de cinco, como o Independiente que venceu a Sul-Americana em 2010, ou com uma linha de quatro. O que se sobressai é a ideia da agressivi dade: dar pouco espaço para o adversário jogar encurtando a bola o tempo todo. Ideia que gera riscos, como deixar a defesa mais vazia, desprotegida. O que, no fim das contas, faz parte: futebol é cobertor curto.
As duas linhas de quatro do Huracán em 2018 — Foto: Reprodução
Desafio no Galo é o maior da carreira
El Turco chega ao Galo com uma missão complicadíssima e uma expectativa dura de bater: o Atlético é o vencedor da tríplice coroa nacional na temporada, tem Supercopa pela frente e agora mira a Libertadores.
Uma pressão que mesmo no apaixonado futebol mexicano, El Turco nunca teve. Outro problema será o calendário: com três competições, o Galo certamente passará dos 65 jogos no ano. El Turco tem uma média de 46 jogos por temporada como treinador, e no Monterrey, onde mais teve jogos em um ano, fechou com 55 partidas.
Turco Mohamed enfrentou o Atlético na Libertadores 2013 — Foto: Divulgação
Seu último trabalho foi excelente: deu um calor memorável no Liverpool no Mundial de Clubes e venceu o Apertura em 2020 jogando bem. Antes, foi mal no Celta de Vigo, onde ficou por 18 jogos e seis meses, e fracassou em seu time do coração, o Huracán: apenas duas vitórias em 13 jogos.
A contratação de um treinador argentino, mais conhecido no México e com sobrenome árabe é, além do personagem, mais um movimento interessante do Galo nos últimos anos. El Turco se junta a Medina, Paulo Sousa, Vojvoda, Moríngio e Abel Ferreira na Série A e Florentín e Pezzolano na Série B como técnicos estrangeiros na temporada que você acompanha de perto no ge.
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